O grupo de pesquisadores Snake Bite estuda que o potencial hemorrágico é o que torna o veneno da "cascavel roraimense" diferente das outras espécies no Brasil
Foto: Caíque Rodrigues
Crotalus durissus ruruima representa uma subespécie de cascavel cujas pesquisas estão em estágios iniciais. Seu nome não é mero acaso. Essa serpente é exclusiva do estado de Roraima e sua toxina possui elementos diferentes que a distinguem das demais espécies de cascavéis encontradas no Brasil. É o que aponta os estudos feitos pelo grupo Snake Bite, ligado ao curso de medicina da Universidade Federal de Roraima.
Criado em 2016, o grupo, além de pesquisas sobre peçonhas de cobras, escorpiões e aranhas, realiza pesquisas, treinamentos e campanhas que visam conscientizar sobre como evitar e também como lidar com acidentes envolvendo animais venenosos.
Sobre a cascavel roraimense, a biomédica Manuela Pucca, coordenadora do projeto, explica que o potencial hemorrágico é o que torna seu veneno diferente.
"Essa variante de cascavel é única, sendo restrita à região de Roraima e suas zonas fronteiriças. Nossas pesquisas até o momento demonstraram que a peçonhas dessa serpente contém toxinas que divergem significativamente das presentes em outras cascavéis no território brasileiro. Os incidentes de envenenamento por essa espécie se caracterizam por uma prevalência notável de sintomas hemorrágicos em comparação com as demais cascavéis, tornando o controle e o tratamento mais desafiadores", explica a coordenadora do projeto.
A dificuldade em controlar o veneno dessa subespécie se dá pois o soro utilizado em casos de ataques é feito com base em cascavéis comuns em outras regiões do país. Por este motivo, o grupo trabalha para modificar o protocolo de produção de antiveneno. Um artigo sobre a cascavel roraimense foi publicado com o nome "Revisão Bibliográfica sobre a Cascavel Roraimense".
"A nossa cascavel ela tem até um nome em homenagem a Roraima. Hoje nós temos seis cascavéis no Brasil sendo essa a que apresenta o veneno com a maior capacidade de ocasionar sangramentos, doenças renais e principalmente morte".
Foto: Caíque Rodrigues
Conforme explicado por Anderson Rocha, um dos colaboradores do grupo de pesquisa, a adaptação singular dessa subespécie de cascavel se deve principalmente à presença de campos abertos nos lavrados de Roraima. Os municípios onde há maior registro da cascavel são Bonfim, Normandia e Cantá, na região Norte do estado.
"O que a torna distinta das outras cascavéis, além do veneno, é o fato de que ela é frequentemente encontrada em áreas abertas do lavrado. Embora possa ocasionalmente ser vista em regiões florestadas, essa ocorrência é rara. Essas serpentes tendem a ser menores do que as encontradas em ambientes mais fechados. Sua dieta preferencial inclui roedores, lagartos e, como segunda opção, aves. Além disso, elas costumam ser mais ativas durante a noite", conforme explica o biólogo.
Para o biólogo, a pesquisa pioneira sobre o veneno da cascavel de Roraima é de grande importância e abre diversas oportunidades para seu uso potencial na área farmacêutica no futuro.
"O fato de esta subespécie possuir um veneno único torna as investigações realizadas pelo grupo Snake Bite especialmente relevantes, visto que estudos e medicamentos que utilizam o veneno de cascavéis buscam determinar se ele pode ser aplicado de maneira mais direcionada no tratamento do câncer."
"É fato que o estudo dessa variante de cascavel possa resultar em avanços inovadores na área da medicina, dado que as toxinas das serpentes representam um recurso valioso", declarou o biólogo Anderson Rocha.
Foto: Caíque Rodrigues
Controle de acidentes ofídicos
Para controlar os ataques não só da cascavel roraimense, como de outros animais peçonhentos, o grupo trabalha com a maior arma: o conhecimento. Uma das ações do Snake Bite Roraima é o treinamento de profissionais da saúde que atendem na emergência do Hospital Geral de Roraima (HGR) para atender vítimas de acidentes ofídicos -- como são chamadas as ocorrências de envenenamento com animais peçonhentos.
"Esse treinamento, diagnóstico e tratamento para o ofidismo é destinado apenas a profissionais da saúde então ele tem uma linguagem mais técnica e clínica onde a gente busca treinar profissionais da saúde como diagnosticar e tratar paciente".
"Roraima hoje é o estado com a maior incidência por picada de cobra e a maior letalidade. Então isso torna um problema de saúde pública pro nosso estado. E esse treinamento ele visa então padronizar esse tratamento pelos profissionais da saúde pra melhorar o prognóstico, a vida e a morbidade dessas vítimas de acidente ofídico", explica Pucca.
Foto: Caíque Rodrigues
Para o gerente de ensino do Hospital Geral de Roraima, o enfermeiro Fabrício Barreto, o trabalho que o grupo realiza com os profissionais da saúde é fundamental para unificar os atendimentos para ocorrências do tipo.
"Ofidismo no estado é um problema bastante recorrente, toda semana aparece pacientes acidentados por picadas de serpentes de modo geral aqui no estado. A maioria dos casos os que vão se agravando... A gente viu a grande importância de capacitar e treinar os profissionais da ponta, médicos, enfermeiros do pronto-socorro que fazem esse atendimento e por isso que a gente chamou esse grupo".
Estudante do terceiro ano do curso de medicina, Altair Neto integra o grupo Snake Bite e acredita na força do grupo como propagador de informações para prevenção de envenenamento por cobras entre profissionais da saúde.
"Eu acredito que isso é algo muito importante porque na nossa mente precisa que a nossa formação seja contemplada também esses requisitos da questão dos acidentes, já que aqui no nosso estado a gente tem um grande número de ocorrências".
"A gente faz uma série de relatos de casos, por exemplo, eu estou com o projeto de iniciação científica pra gente estabelecer um guia prático de conduta pra padronizar o atendimento do acidente ofício aqui no HGR", disse o jovem.
O grupo Snake Bite divulga suas ações, trabalhos e pesquisa por meio da internet, no site oficial, Instagram e canal no YouTube.
Por Caíque Rodrigues
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